Reaproveitamento de medicação para o HIV mostra potencial contra demência

Por Docmedia

18 maio 2023

Uma das principais características de doenças neurodegenerativas, como a doença de Huntington e várias formas de demência, é o acúmulo no cérebro de aglomerados de proteínas mal dobradas, como a huntingtina, a proteína tau e a beta-amiloide. Esses agregados proteicos levam à disfunção, degradação e eventual morte das células cerebrais e ao aparecimento de sintomas.

No cérebro saudável, esse processo de acumulação de agregados proteicos tóxicos é em parte compensado por processos endógenos de depuração como a autofagia. E parecem ser exatamente esses processos de depuração de resíduos tóxicos que deixam de funcionar adequadamente nas doenças neurodegenerativas.

A novidade é que pesquisadores da Universidade de Cambridge anunciaram que, ao mesmo tempo em que comprovaram a disfunção de um desses processos de depuração do tecido neural na doença de Huntington, também identificaram um medicamento reaproveitado capaz de restabelecer a função depurativa perdida. A publicação na revista Neuron conta que o trabalho utilizou camundongos modificados geneticamente para desenvolverem doença de Huntington ou um quadro demencial mediado pelo acúmulo de agregados de proteína tau mal dobrada.

Nesses modelos de doença, os pesquisadores demonstraram que a deposição proteica anormal tinha como base a secreção por células microgliais de um conjunto de moléculas que ativam um interruptor chamado CCR5 na superfície celular. A ativação do CCr5, por sua vez, prejudica o funcionamento do processo de autofagia e a depuração dos agregados proteicos anormais.

Em um experimento posterior, a equipe bloqueou geneticamente a expressão do CCR5 nos mesmos modelos de doença, obtendo redução significativa da deposição de agregados proteicos. Curiosamente, o CCR5 também é utilizado pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) como porta de entrada nas células, o que levou ao desenvolvimento de moléculas inibidoras de CCR5 visando tratar a infecção viral.

Uma dessas moléculas, o maraviroc, já aprovado nos EUA e União Europeia para tratamento do HIV, foi utilizado então pela equipe de Cambridge nos dois modelos de doença do estudo. Em ambos os modelos foi obtida significativa redução dos agregados proteicos. Entretanto, os achados ficaram por aí na doença de Huntington porque os animais desenvolvem apenas sintomas leves mesmo sem tratamento.

Já na demência por proteína tau, em que os animais evoluem com déficit cognitivo importante, o tratamento com maraviroc retardou a perda de células neuronais e o declínio cognitivo dos animais em testes de memória na comparação com seus pares não tratados.

Segundo os autores, ainda que o maraviroc não seja exatamente uma bala de prata, seus achados indicam um caminho promissor a ser trilhado para novas terapias.

Quer saber mais?

Fonte: https://www.cell.com/neuron/fulltext/S0896-6273(23)00268-4?_returnURL=https%3A%2F%2Flinkinghub.elsevier.com%2Fretrieve%2Fpii%2FS0896627323002684%3Fshowall%3Dtrue

Total
0
Shares

Deixe uma resposta

Postagens relacionadas
%d blogueiros gostam disto: